Jerónimo de Sousa no debate
do Programa do Governo

«É possível construir um Portugal<br>mais justo e solidário»

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(...)

Hoje nada pode iludir a exis­tência, com a nova com­po­sição da As­sem­bleia da Re­pú­blica, da pos­si­bi­li­dade real de adoptar as de­ci­sões que cor­res­pondam a le­gí­timas as­pi­ra­ções do povo por­tu­guês.

Está agora aberta uma nova fase na vida po­lí­tica na­ci­onal sus­cep­tível de res­ponder a muitos dos pro­blemas mais ime­di­atos dos tra­ba­lha­dores e do povo por­tu­guês.

Uma nova fase com um Go­verno que tomou posse e se apre­senta a esta As­sem­bleia com o seu Pro­grama e tem reu­nidas as con­di­ções para que entre em fun­ções, adopte uma po­lí­tica que as­se­gure uma so­lução du­ra­doura na pers­pec­tiva da le­gis­la­tura.

Um per­curso que não será fácil, nem sim­ples se ti­vermos em conta a re­a­li­dade e o es­tado em que o País se en­contra como re­sul­tado das po­lí­ticas re­a­li­zadas nos úl­timos anos e agra­vadas subs­tan­ci­al­mente na go­ver­nação da co­li­gação PSD/​CDS-PP, que neste de­bate se re­cu­saram a aceitar.

Uma go­ver­nação que deixou o País de rastos e na cauda do de­sen­vol­vi­mento na Eu­ropa.

Com uma eco­nomia que andou mais de uma dé­cada para trás e com mi­lhares de en­cer­ra­mentos de em­presas. Um País que em­po­breceu desde a sua to­mada de posse, cerca de 10 mil mi­lhões de euros. Um País aba­tido com a imersão do in­ves­ti­mento e com efeitos im­pre­vi­sí­veis no seu de­sen­vol­vi­mento fu­turo.

Um País cres­cen­te­mente en­di­vi­dado e um ser­viço da dí­vida su­fo­cante, com o de­sem­prego real a atingir mais de um mi­lhão e cem mil por­tu­gueses, com ní­veis dra­má­ticos de pre­ca­ri­e­dade que atingem quase um terço dos tra­ba­lha­dores as­sa­la­ri­ados.

Um País cres­cen­te­mente de­si­gual e in­justo pela ace­le­rada des­va­lo­ri­zação dos ren­di­mentos de tra­balho. Uma re­gressão ina­cei­tável na dis­tri­buição da ri­queza na­ci­onal e que se traduz numa queda his­tó­rica dos sa­lá­rios que, nos úl­timos 50 anos, nunca como hoje pe­saram tão pouco face aos lu­cros, rendas e juros.

Ca­rac­te­rizar a po­lí­tica re­a­li­zada com uma po­lí­tica de aus­te­ri­dade não é ri­go­roso. Foi uma vi­o­lenta po­lí­tica de ex­plo­ração, em­po­bre­ci­mento, de trans­fe­rência de ren­di­mentos do tra­balho para o ca­pital.

Um País mais de­si­gual e in­justo com o au­mento de mais 800 mil por­tu­gueses a viver abaixo do li­miar da po­breza nos úl­timos quatro anos, ao mesmo tempo que se cor­tava nas pres­ta­ções so­ciais, nos ren­di­mentos dos por­tu­gueses mais ca­ren­ci­ados, nos sub­sí­dios de de­sem­prego, nos trans­portes aos do­entes não ur­gentes, nos com­ple­mentos aos idosos. Uma in­sen­sível po­lí­tica so­cial que ar­ruinou fa­mí­lias a quem ainda pe­nho­raram as casas onde mo­ravam.

Um País com mais de meio mi­lhão de por­tu­gueses for­çados à emi­gração e cres­cen­te­mente de­ser­ti­fi­cado numa grande parte do seu ter­ri­tório.

Um País su­fo­cado por um au­mento brutal de im­postos sobre o tra­balho e o con­sumo de bens po­pu­lares e es­sen­ciais.

Com ser­viços pú­blicos de­gra­dados e di­reitos so­ciais das po­pu­la­ções am­pu­tados, que de­bi­li­taram o con­junto dos di­reitos so­ciais dos por­tu­gueses, no­me­a­da­mente à saúde, à edu­cação, à pro­tecção so­cial, à cul­tura.

Um País em de­clínio, sa­queado no seu pa­tri­mónio com a po­lí­tica de pri­va­ti­za­ções que o tornou mais de­pen­dente e mais frágil.

Parar des­truição

Foi este País que dei­xaram PSD e CDS-PP com a sua opção por uma po­lí­tica de terra quei­mada que aqui neste de­bate, ex­pres­sando um azedo mau perder, se vê que pre­tendem con­ti­nuar, agora na opo­sição, apos­tados que estão em dar uma imagem de imi­nente ca­tás­trofe no País em re­sul­tado da nova si­tu­ação de­cor­rente das elei­ções.

An­te­cipam um novo apo­ca­lipse, mas o que todas as suas de­cla­ra­ções ca­tas­tro­fistas visam é pro­vocar o medo, con­tri­buir ob­jec­ti­va­mente para pôr o País mais no fundo e jus­ti­ficar a sua po­lí­tica de de­clínio na­ci­onal!

São os mesmos que dei­xaram o País na grave si­tu­ação de re­tro­cesso eco­nó­mico e so­cial em que se en­contra que vêm apre­sentar uma Moção de Re­jeição ao Pro­grama do Go­verno.

Re­jei­ta­remos a Re­jeição! A nossa res­posta é inequí­voca: vo­ta­remos contra!

Vo­ta­remos contra porque já chega de po­lí­ticas de ex­plo­ração, em­po­bre­ci­mento e re­tro­cesso ci­vi­li­za­ci­onal.

Vo­ta­remos contra porque que­remos manter aberta a ja­nela da es­pe­rança que a luta dos tra­ba­lha­dores e das po­pu­la­ções abriu.

Um voto de re­cusa que vai ao en­contro da von­tade ex­pressa pelo povo por­tu­guês que afirmou com a sua pro­lon­gada luta e de­pois com o seu voto a im­pe­ra­tiva ne­ces­si­dade de as­se­gurar a in­ter­rupção do rumo de de­sastre que vinha sendo pros­se­guido no País.

Voto que in­ques­ti­o­na­vel­mente é sinal e ex­pressão da von­tade de parar com a des­truição do País e de as­pi­ração a uma vida me­lhor, num Por­tugal com fu­turo!

Va­lo­rizar a con­ver­gência

No Pro­grama que o Go­verno do PS apre­sentou afirma-se a von­tade de in­verter o rumo das po­lí­ticas dos úl­timos anos e um pro­pó­sito de mu­dança que de­se­jamos que a vida con­firme.

Este não é, na­tu­ral­mente, o nosso Pro­grama. Não seria exi­gível, re­co­nhe­cidas que são as di­fe­renças pro­gra­má­ticas, que o Pro­grama do Go­verno do PS cor­res­pon­desse ao con­junto de op­ções e po­lí­ticas que iden­ti­fi­camos como ne­ces­sá­rias para, de forma só­lida, dar res­posta a ques­tões es­tru­tu­rais que o País en­frenta e que PSD/​CDS agra­varam ex­po­nen­ci­al­mente. Mas é um Pro­grama que acolhe con­tri­bui­ções do PCP re­sul­tantes de um es­forço de con­ver­gência para en­con­trar res­postas e so­lu­ções que pu­dessem res­ponder a in­te­resses e as­pi­ra­ções pre­mentes dos tra­ba­lha­dores e do povo por­tu­guês e que fi­caram plas­madas na «Po­sição con­junta do PS e do PCP sobre so­lução po­lí­tica».

É a va­lo­ri­zação da con­ver­gência que con­ti­nu­amos séria e em­pe­nha­da­mente a pri­vi­le­giar. E foi o grau dessa con­ver­gência que per­mitiu o grau de com­pro­misso que, con­cre­ti­zado, tra­du­zirá uma me­lhoria na vida dos por­tu­gueses.

Com­pro­misso que abre a pos­si­bi­li­dade de, entre ou­tros, dar passos na de­vo­lução de sa­lá­rios e ren­di­mentos, de repor os com­ple­mentos de re­forma dos tra­ba­lha­dores do sector em­pre­sa­rial do Es­tado, de va­lo­rizar sa­lá­rios e travar a de­gra­dação con­ti­nuada das pen­sões, de res­ti­tuir parte das pres­ta­ções so­ciais su­jeitas à con­dição de re­cursos, de repor os fe­ri­ados re­ti­rados, de ga­rantir me­lhores con­di­ções de acesso ao di­reito à saúde e à edu­cação, de fazer re­verter os pro­cessos de con­cessão e pri­va­ti­zação de em­presas de trans­portes ter­res­tres.

Novo rumo

Neste pro­cesso não ilu­dimos di­fe­renças. Nem omi­timos a visão dis­tinta na res­posta a con­tra­di­ções pa­tentes na re­a­li­dade por­tu­guesa, no­me­a­da­mente as que se prendem com a ne­ces­si­dade de pro­mover um cres­ci­mento eco­nó­mico ro­busto, com cri­ação de em­prego e mais in­ves­ti­mento, num quadro de cons­tran­gi­mentos in­ternos e ex­ternos que são, a nosso ver, um ma­ni­festo co­lete-de-forças im­pe­di­tivo da pros­se­cução desses ob­jec­tivos e da re­a­li­zação de um de­sen­vol­vi­mento so­be­rano.

O passo que agora se dá é um passo im­por­tante para travar a ofen­siva mais de­sen­freada destes anos e que de­se­jamos e es­pe­ramos seja um sa­fanão na po­lí­tica das ine­vi­ta­bi­li­dades que cerca a vida dos por­tu­gueses.

Esta é uma so­lução para a qual nin­guém pres­cindiu da sua in­de­pen­dência ide­o­ló­gica, po­lí­tica e do seu pró­prio pro­grama, mas onde está pre­sente a mútua ga­rantia e o em­pe­nha­mento comum de con­tri­buir para as­se­gurar para o País um outro rumo de de­sen­vol­vi­mento eco­nó­mico e pro­gresso so­cial.

A pos­si­bi­li­dade que agora se abre não só não dis­pensa como con­firma ser in­dis­pen­sável a con­cre­ti­zação de uma po­lí­tica pa­trió­tica e de es­querda, como aquela que o PCP de­fende, per­sis­tindo na luta pelo seu re­co­nhe­ci­mento junto do nosso povo como a grande so­lução para os pro­blemas do País.

Uma po­lí­tica que de­volva ao País o que é do País, capaz de criar ri­queza e con­cre­tizar a sua mais justa re­par­tição, uma outra po­lí­tica fiscal que tenha dos di­reitos dos tra­ba­lha­dores a mesma ma­triz que a Cons­ti­tuição con­sagra e pro­jecta, que no plano da edu­cação, da saúde, da ci­ência e da cul­tura se ali­cerce numa con­cepção não de des­pesa mas de in­ves­ti­mento no fu­turo, que vença os cons­tran­gi­mentos e afirme a so­be­rania na­ci­onal.

Com a mesma se­ri­e­dade e sin­ce­ri­dade com que es­ti­vemos no pro­cesso, es­ta­remos com se­ri­e­dade e sin­ce­ri­dade na va­lo­ri­zação da con­ver­gência ou na afir­mação da di­fe­rença e da di­ver­gência, re­a­fir­mando que o nosso prin­cipal com­pro­misso é com os tra­ba­lha­dores e o povo.

Temos a cons­ci­ência de que o povo não exige nem quer tudo de uma vez. Mas também não quer que se mude al­guma coisa para ficar tudo na mesma.

Os tempos que temos pela frente são tempos de grande exi­gência, mas também de con­fi­ança de que é pos­sível cons­truir um Por­tugal mais justo, mais so­li­dário e mais de­sen­vol­vido. Nisso o PCP em­pe­nhará a sua acção e a sua luta.

(Tí­tulo e sub­tí­tulos da res­pon­sa­bi­li­dade da re­dacção)




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